A Casa-Museu Fernando de Castro diz-te alguma coisa? Se pelo nome não chegas lá, então prepara-te para ficar boquiaberto. Pois, este é um espaço, no mínimo, excêntrico e com muito para contar.
Localizado na Rua Costa Cabral, o número 716 não deixa antever o conteúdo do seu interior. Disfarçada pela simplicidade da fachada do prédio, a Casa-Museu Fernando de Castro esconde um ‘tesouro’. Um verdadeiro altar sem culto, mas mais adiante explicamos o porquê desta designação.
Pinturas, esculturas, livros e (muita) talha dourada adornam o interior do espaço, que conta com um acervo de centenas de peças. Um local que desafia a lógica inerente a qualquer museu. Mas este não é um espaço museológico qualquer. É uma casa-museu e, tal como o próprio nome indica, reflete a personalidade de Fernando de Castro, o seu antigo dono.
Índice
Quem foi Fernando de Castro?
Antes de contarmos como foi a nossa experiência no local, importa conhecer o mentor deste museu exuberante. Fernando de Castro (1889-1946) era filho de um próspero comerciante, cujos negócios estavam sediados na Rua das Flores, no Porto.
Com a morte do pai, em 1918, Fernando de Castro assegurou a continuidade dos negócios. No entanto, o mundo comercial não era a grande paixão. De facto, o pulsar da sua vida ficava à margem do desempenho profissional. Pintor, poeta, caricaturista e colecionador, o proprietário do número 716 da Rua Costa Cabral foi isto e mais ainda.
Aficionado pelo mundo das artes, Fernando de Castro fez da sua própria casa um museu. Graças a Maria da Luz Castro, sua irmã, que doou o espaço, hoje temos as portas abertas para este lugar repleto de histórias para contar. Atualmente, quem gere a tutela da Casa-Museu Fernando de Castro é o Museu Nacional Soares dos Reis. Já há algum tempo que queríamos conhecer este sítio. Por isso, agendámos uma visita guiada que dificilmente iremos esquecer.
Uma visita guiada por um altar sem culto
Ana Anjos Mântua, coordenadora da Casa-Museu de Castro, recebeu o Porto Secreto, acompanhando-nos numa visita guiada às várias divisões do edifício. Uma ajuda essencial para compreender melhor a falta de lógica aparente.
Sala Minhota (ou Sala Regional)
A visita começa na antiga sala de estar da casa; e desde logo somos surpreendidos. Por todos os lados, é possível ver objetos e peças de arte. Uma verdadeira ‘confusão’, mas ao mesmo tempo cativante.
A Sala Minhota é um das poucas divisões onde se encontram figuras populares. De facto, aqui encontram-se vários elementos alusivos ao Minho (e não só), daí o próprio nome.
Há dois tipos de colecionismo na Casa-Museu Fernando de Castro. Por um lado, temos a Arte Sacra, que está presente em praticamente toda a casa. Pelo outro lado, temos a Pintura Naturalista portuguesa“, explica Ana Anjos Mântua, coordenadora do espaço museológico.
Sala de Jantar
Depois de passar pelo vestíbulo, encontramos a Sala de Jantar. De imediato, somos invadidos por uma sensação de ‘peso’. Ou seja, há uma espécie de horror ao vazio, mas não só nesta divisão. De facto, é uma constante na casa.
Aqui vemos paredes revestidas, bem como uma proliferação de imagens religiosas em fila, de todos os tamanhos e feitios. As figuras religiosas são mesmo um fator dominante em praticamente toda a parte.
Sala Amarela
Após subirmos as primeiras escadas, entramos na Sala Amarela, onde somos brindados com um ambiente completamente distinto. De repente, é como se tivéssemos à frente uma ‘pequena Versalhes’.
Os tons dourados e o requinte dominam os elementos decorativos, em vez dos traços tipicamente religiosos das divisões anteriores. Ana Anjos Mântua, coordenadora da Casa-Museu, explica-nos que esta era uma Sala de Baile.
Portanto, um espaço destinado a momentos de descontração e diversão. Há mesmo uma ligeira ‘leveza’ no ar; aqui respira-se mais. Por esta altura, já estamos certos que apesar deste não ser um dos museus mais ‘óbvios’ para visitar no Porto, que vale mesmo a pena.
Acesso ao 2.º andar
Na galeria do 2.º andar, e ao subir cada degrau, parece que somos imediatamente transportados para uma igreja. De novo, predominam as imagens religiosas e também os relicários.
Destaca-se também um vitral, cujas cores vivas e adornos fazem-nos sentir numa qualquer catedral. De facto, é preciso explicar a origem desta quantidade ‘absurda’ de Arte Sacra.
Arte Sacra em voga
Com a extinção das ordens religiosas em Portugal, no séc. XVIII, houve um desmantelamento e venda de alguns materiais oriundos de igrejas, mosteiros ou conventos.
Neste contexto, houve quem, como D. Fernando II, comprasse um convento para converter a posteriori num palácio. Mas, houve quem, como Fernando de Castro, transportasse os templos religiosos diretamente para sua casa.
Esta casa é um verdadeiro altar sem culto”, destaca Ana Anjos Mântua, coordenadora da Casa-Museu de Castro.
Sala Azul
O nome desta sala deve-se à existência de paredes e cortinados azuis, mas também podemos chamar-lhe de ‘Sala Chinesa’. Afinal, há vários objetos orientais expostos, tais como figuras chinesas, jarras e leques, entre outros.
Sala de Caricaturas
Nesta divisão contactamos de perto com a faceta de caricaturista de Fernando de Castro:
Aqui temos duas temáticas diferentes. Por um lado, há caricaturas que são uma abordagem humorística à toponímia de vários lugares. Por outro lado, há caricaturas de membros da elite cultural do Porto [da primeira metade do séc. XX]”, explica Ana Anjos Mântua, coordenadora da Casa-Museu de Castro.
Quarto de dormir
Estamos quase a chegar ao fim da visita guiada, absolutamente extasiados pela experiência. Mas, quando pensamos que nada mais pode surpreender-nos, eis que somos recebidos pelo quarto de dormir.
Há um misto de Arte Sacra com requinte; e sobre a cama estão algumas imagens religiosas, que nos encaram de frente. O refúgio definitivo de um homem peculiar e excêntrico; uma figura devota da arte e com crenças fortes.
Por tudo isto (e muito mais), vale a pena conhecer este museu ‘secreto’ do Porto; um derradeiro altar sem culto!
Onde: Rua de Costa Cabral, 716
Mais informações: 22 339 3770 / Perfil de Instagram
Reservas de visitas: aqui